sábado, 28 de agosto de 2010

sobre o orgasmo e outras distrações.


De Nelson Botter Jr.

Ele acorda. Ela acorda. Mais um dia, mais um mês, mais um ano, mais uma vida. Uma vida a dois, regada de dificuldades, mas que lhes proporciona colheitas espetaculares. Aprenderam os truques de um bom plantio. Nada sabem, é claro, mas sabem. Doeu aprender, mas a dor é necessária. Basta observar, estúpido cupido, como as coisas boas da vida estão sempre ligadas à dor, como procuramos o gozo contínuo, a satisfação da insatisfação latente. E isso dói, como dói. Quem disse foi o velho do charuto, aquele da Rua Berggasse 19, nada tenho com isso e não aceito reclamações.

E fez-se a luz, que faz jorrar o sangue, todos os dias, que traz os orgasmos múltiplos de simplesmente ser, existir, respirar. É preciso estancar a ferida com a ponta da faca incandescente, cauterização just-in-time, que traz o alívio, o gozo. Ele quer gozar nela(e), ela quer gozar nele(a), eles querem gozar no mundo, mas o mundo não quer gozar neles. Entretanto, se deixam levar pelas vielas do prazer, afinal isso é amar, é ousar um salto no escuro, é confiar seu destino a mais do que apenas você, é permitir que a tampa feche a panela, é escolher um cúmplice para as piores e melhores horas, é sentir de verdade a razão de se viver por viver. É jorrar a semente, é plantar vida, novas vidas ou vidas novas.

O objetivo simples e direto, olhinhos virados, pêlos arrepiados, gemidos incontidos... A maior das maravilhas do universo. E somado ao amor, o que dizer? Insuperável. Pois ele talvez seja a maior das perversões, a prisão que liberta, a indefectível filosofia na alcova, o que nos torna rijos e pulsantes. Viva a dor de viver a dois e viva duas vezes mais. É um gozo só...

Nelson Botter Jr é cronista do Blônicas .

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